quarta-feira, 27 de junho de 2012

Poesia de Mariana Oliveira

( Este livro pode ser encontrado no IRPA)


Castelinho

Mariana Oliveira

Tem gente vizinha, bem pequenininha
Fazendo zuada
Uma zuada gostosa, uma zuada treitera
Parece uma feira com as noticias do dia
Uma alegria, uma ânsia de falar
É um canto melódico, é um blá blá blá
Ou será um piu, piu, piu?
Vixe, quem ouviu aquela música toda?
Tem cantor com jeito de plebeu
Tem poeta que acha que é Romeu
Psicólogo tirando a Piaget
Lavadeira com beleza de en-doi-de-cer,
E quem iria dizer
Que essa conversa toda vem do telhado de um castelo?
Cheio de botãozinho amarelo
E outras flores a balançar,
No balanço do encantado vento
Nem um só, um só momento elas pensam em parar,
Que delicia o castelo branco
No meio do Semi-árido
Tem o brilho do sol dourado
Uns cactos meio cactante,
Jeito sábio, meio pensante
Corpo forte e bem ativo, um modo alegre e vivo
A comunidade do castelo,
É de um jeito passarinho
Falatório de passarada,
Borboletas delicadas e flores de uma nobreza
Esta é a natureza ativa do castelinho
Nos andares altos uns ninhos
Macios e bem quentinhos
Confortam os bebêssarinhos que lá estão
Começando a entender
Que um dia as asas crescem
E pra voar tem que bater,
Que o mundo é uma magia pra mim e pra você
Uma doce melodia que todos os dias cantamos e nos faz viver,
Castelinho, Castelão, onde está o teu coração?
Ele logo responde: está nessa doce canção,
Uma bela canção de amor
Do passarinho no seu ninho
Do cacto, do beija-flor
Que sem saber fazer poesia
Deixam a alma a sorrir
Agradecida pela dádiva de existir.

Velho Chico e o Vapor

Foto do acervo pessoal do saudoso Cosme


VELHO CHICO E DONA VAPOR

Mariana Oliveira


Dona vapor é bela, seu coração é tão imenso e livre,
antigamente viajava embalada por águas de sonhos e já é bem velhinha,
 mas nunca deixou de sonhar e amar,
amar muito aquele a quem entregou seu coração
 com tanta pureza, tanta paixão, tanta beleza!
Dona Vapor leva nas suas lembranças passeios ao sol,
risonhas crianças a brincar, a banhar-se
nas gotas clarinhas e serenas do seu velhinho,
 do seu amado velhinho, era Opara seu nome de índio,
Opara de águas que não param de correr, 
mas depois ficou conhecido como Chico, 
o velhinho bem amado do coração de Dona Vapor.
Lavadeiras lavam as dores do coração nas beiras do rio,
marujos navegam nas águas de sonhos embalados nos vapores e barcas,
 com as noites, as estrelas, o sol, os pássaros.
 Pescadores buscam o alimento e alimentam almas
de histórias e cantigas em noites de luar,
em dias de peleja e dias de descansar.
E Dona Vapor, que já não navega mais,
 carrega na sua lembrança vidas de tempos atrás,
histórias contadas, das festas, da marujada, do Bumba-Meu-Boi,
das rodas de São Gonçalo,
tudo que um dia foi, motivo de rosto risonho.
E fala para seu velho Chico, para o Vento, para si mesma: 
‘‘lembro de todas as viagens que fizemos juntos,
 as brincadeiras que brincamos, os perigos que passamos
envolvidos nas noites de tempestades.
Lembro até de quando você brigava comigo e eu ria,
 eu ria...porque eu sabia que logo que tudo passasse, 
 lá pelo amanhecer do dia, o sol ia nascer brilhante, mágico e galante,
nos iluminando a alma, e você se acalmaria.
 Então a gente se amava, mais e mais e celebrava, coisas que se foram um dia...’’
Chico canta o seu canto de águas doces, 
‘‘Eu sempre estarei aqui,
no   silêncio e na paisagem, nos corações, nas viagens,
 bem aí dentro de ti.
A imensidão do céu que me acompanha,
me leva a conhecer mundos, horizontes, cidades,
vejo a solidão, a paixão, a saudade, vejo a despedida,
 os caminhos da vida e da liberdade.
Minhas veias são correntes, que jamais irão secar,
pois homens, mulheres, bichos, crianças, 
vêm a mim se alimentar, trazem as suas almas
 e buscam nas minhas águas se renovar,
sinto a tristeza querendo me pegar e logo digo pra ela:
vai-te embora pr´acolá, sinto a veia querendo parar,
sinto dor, mas vivo e sobrevivo, insisto e sigo e vou,
correntes e correntezas, grande ser da natureza,
irmão do homem, irmão da flor.’’
E o tempo continua a embalar
o Velho Chico do nosso coração, as lavadeiras, os pescadores,
 os amantes, os amores, o vento com seus lamentos,
 seus cantos de sentimentos,
os bichos e encantados, sereias e apaixonados,
Petrolina, Juazeiro, meninos e velhos barqueiros,
Juazeiro e Petrolina, sua cor, sua voz, o seu cheiro,
esta terra nordestina.
Temos grande esperança, que também nossas crianças
Possam com o Velho Chico brincar e crescer
Ele nos alimenta,  nos dá força, nos sustenta
Nos  fascina   e faz viver.